sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O direito de voto do preso no Estado Democrático de Direito

O exercício da soberania popular manifestado por meio do direito/dever político de alistamento e de elegibilidade, assegurado a homens e mulheres, sem distinção de qualquer natureza, o qual é concretamente realizado através do sufrágio universal, um direito-dever de voto como contribuição individual de cada cidadão para a organização do Estado, constitui a base para a efetivação de um Estado Democrático de Direito que visa à construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que respeite à dignidade da pessoa humana.


Os diplomas internacionais de Direitos Humanos garantem a todos os cidadãos o direito de expressar mediante eleições livres, através do voto secreto, sua opinião a respeito das administrações públicas federal, estadual e municipal, bem como acerca da correta aplicação dos recursos públicos ante a vontade maior por uma gestão verdadeiramente proba, transparente e democrática. Nesta esteira estabelece a Carta Política de 1988, a obrigatoriedade do voto aos maiores de dezoito anos, e a faculdade aos maiores de dezesseis e menores de dezoito anos de idade.

A Constituição Federal vigente dispõe ainda expressamente, que é vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos (art. 15, III, CF/88). Na verdade, denota-se que tal preceito constitucional trata do próprio respeito ao princípio da presunção de inocência, também contemplado explicitamente no texto constitucional, visto que a culpabilidade só pode ser considerada a partir de decisão condenatória irrecorrível, sendo resguardado a todos os acusados em geral o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Fazendo uma interpretação literal e restritiva da Lei Maior, é possível argumentar de forma tranquila e pacífica que o mandamento constitucional (art. 15, III CF/88) não abrange os presos provisórios, devendo ser garantido, obrigatoriamente, na prática o direito-dever de voto de todas as pessoas que se encontram presas (imputáveis, maiores de 18 anos de idade); bem como aos inimputáveis, maiores de 16 e menores de 18 anos de idade, ou seja, todos os infratores que estiverem apreendidos, com fulcro nas disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente que desejarem facultativamente exercer o direito-dever cívico de participar do processo de eleições.

Em razão disso, àqueles que estão encarcerados em cadeias públicas e presídios, seja por prisão em flagrante delito, seja por prisão preventiva ou temporária, em razão de decretação de pronúncia e sentença condenatória recorrível, e não possuírem contra si condenação criminal firme, poderão em período eleitoral, exercer o direito constitucional consagrado e fundamental de votar, pois tal direito, trata-se, inclusive, de cláusula pétrea.

Neste sentido, reza ainda o artigo 38 do Código Penal com redação dada pela Lei n.º 7.209/84, que o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade... Deve-se garantir aos presos a efetiva concretização dos direitos civis e políticos essenciais ao pleno exercício da cidadania, especificamente, o direito-dever de voto, em eleições livres e democráticas, para escolha dos representantes da administração pública municipal, estadual e federal, forma e sistema de governo.

Todavia, observa-se que o Estado por não garantir o exercício de todas as prerrogativas constitucionais aos cidadãos (ãs) presos (as), atesta a sua incompetência para gerir o seu sistema prisional, ao passo em que, não raro, constata-se uma omissão dos órgãos do Sistema de Justiça no que tange a efetivação desses direitos. Admite, também, o fracasso do sistema expresso pela superpopulação carcerária, a morosidade na tramitação dos processos criminais, o acesso limitado à assistência jurídica gratuita, e toda forma de violação dos direitos humanos de presos provisórios, condenados e de seus familiares.

A realidade subumana a que está submetida a considerável parcela da população brasileira que hoje se encontra encarcerada, reflete as fragilidades sociais de uma sociedade extremamente desigual, sobretudo, no que concerne o acesso à justiça e aos direitos humanos básicos. Torturas, maus-tratos, superlotação, penas vencidas, presos provisórios em permanente espera, humilhações de todas as formas... O sistema prisional brasileiro acoberta um contínuo cenário de terror, que insiste em se manter entre nós, onde somente em um Estado de exceção se justificaria a suspensão dos direitos políticos ativos. É justamente em função disso, que o direito de votar é uma conquista de toda a sociedade brasileira, e que o Estado não tem o direito de violá-lo ou suprimi-lo.

Por outro lado, é sabido que além do estigma da exclusão social, o preso ainda parece está completamente ignorado ou abandonado, por aqueles incumbidos de tomarem as decisões no âmbito das políticas públicas, quando não o inclui no disputado universo do eleitorado, não lhe dando representatividade alguma nas esferas de poder, colocando-o muitas vezes à margem dos direitos fundamentais da pessoa humana, sem assegura-lhe sequer os instrumentos institucionalizados eficientes para reivindicá-los.

Uma situação diversa poderia ser vislumbrada, caso lhe fosse respeitado o direito de votar. Pois seria suscitada pelo menos em tese, a discussão e a formação crítica dos encarcerados, seria, até mesmo, uma forma de serem ouvidos, sem recorrer a mecanismos violentos. Evidentemente, a garantia do direito ao voto, por si só, não vai alterar o atual panorama carcerário do Brasil.. Entretanto, seria dada aos presos esta chance.

Postado por Antonio de Pádua.